Assistir a essa série sobre o criador da revista e do império Playboy, é assistir a uma aula de sociologia. Pelo menos três autores são convidados a dialogar conosco:
Marilena Chauí, que discorre sobre como a pornografia, ao contrário do que aparenta ser, é um sintoma de nossa super-repressão sexual;
Shere Hite que anuncia que a ameaça à família no século XX não foi a emancipação feminina, mas o culto à solteirice masculina, em voga a partir da década de 50; e
Pierre Bourdieu, quando descreve os dispositivos cotidianos que sustentam a dominação masculina e aponta como as mulheres participam, sem se darem conta, da manutenção desse domínio.
Ou seja, o que para nós e para a cultura de massa é algo perfeitamente natural e desejável, segundo esses autores fala mais de repressão e dominação do que de liberação e ausência de preconceitos.
A revolução sexual é o mote e a inspiração de Heffner, anunciada inúmeras vezes na série. Certamente, com sua ajuda passou-se a falar mais de sexo, a nudez deixou de ser tabu (para quem?) e homens e adolescentes ficaram mais felizes com as fotos nuas de mulheres esculturais.
Mas todo esse glamour oculta uma verdade desconfortável: o fato de que nossa liberdade sexual, performática, predadora e pornográfica, oculta uma miséria sexual: nós (ocidentais) não sabemos o que é erotismo. E nisso Chauí tem razão quando coloca a pornografia como a morte da libido e do erotismo.
E essa morte vai de braços com a cultura da solteirice para homens, outro adágio de Heffner. Porque a sexualidade conjugal é monótona, sem graça. Para manter a excitação é preciso ser livre, sem amarras... nem relacionais e nem morais. A equação sexo + amor + erotismo não entra aí. O sexo vira entretenimento e corpos são consumidos. Quais? Os das mulheres, vestidas de coelhinho. As Playgirls, libertas, donas entusiastas de seus corpos, de fato, estão a serviço do mundo masculino, de sua dominação, diria Bourdieu. Novamente... e nem se dão conta disso.
Texto: C. Sutter
Comments